08 novembro 2006

A Narrativa na Transmissão da Clínica

Alicia Navarro de Souza*

 

Lutar com as palavras

é a luta mais vã,

no entanto lutamos

mal surge a manhã.

Carlos Drummond de Andrade

 

 

A importância da narrativa na literatura médica atual faz-se possível em função da

tensão estruturante doente/doença inerente à prática médica. Desta forma, a narrativa vem

sendo valorizada na discussão de aspectos éticos e epistemológicos do método clínico e

sua transmissão na formação médica.

Neste artigo apresentamos o trabalho sobretudo de médicos e professores de

literatura nos campos por eles cunhados de medicina baseada na narrativa, ética narrativa

e literatura e medicina, após contextualizar este movimento numa breve história sobre a

institucionalização dos saberes das áreas humanas e sociais nas instituições médicas.

No Brasil a ênfase na narrativa se encontra restrita a pesquisas qualitativas em

saúde, conduzidas principalmente por profissionais das áreas humanas e sociais. Assim,

cotejaremos o trabalho sobre narrativa apresentado na literatura médica internacional com

iniciativas realizadas na Faculdade de Medicina da UFRJ no campo entre nós conhecido

por Psicologia Médica.

Pretendemos, assim, por em perspectiva o poder das palavras e as palavras do

poder cuja dialética é sempre presente na constante e perene problemática da

hierarquização de valores na prática e formação médicas.

 

Uma Breve História

Nas Conferências Introdutórias, Freud (1916 [1915]) nos fala do abismo entre as

operações de conhecimento na medicina e na psicanálise: o ver e o escutar. E se

associamos o ver à eficácia de uma ação sobre o real, que é passível de uma redução

demonstrativa aos dados sensoriais, e o escutar ao valor de verdade no discurso, que se dá

na descoberta interpretativa entre curso associativo e atenção flutuante, tornamos ainda

mais precisa a diferença entre o ato médico e o ato psicanalítico. Como nos diz Freud:

Na formação médica os senhores estão acostumados a ver coisas. Vêem uma

preparação anatômica, o precipitado de uma reação química, a contração de um

músculo em conseqüência da estimulação de seus nervos. Depois, pacientes são

demonstrados perante os sentidos dos senhores: os sintomas de suas doenças, as

conseqüências dos processos patológicos e, mesmo, em muitos casos, o agente da

doença isolado. [...] Assim, um professor de curso médico desempenha em elevado

grau o papel de guia e intérprete que os acompanha através de um museu, enquanto

os senhores conseguem um contato direto com os objetos exibidos e se sentem

convencidos da existência dos novos fatos mediante a própria percepção de cada

um.

Na psicanálise, ai de nós, tudo é diferente. Nada acontece em um tratamento

psicanalítico além de um intercâmbio de palavras entre o paciente e o analista

(Freud, [1916 [1915]] 1976, p.28-29).

Além da diferença entre os modos de conhecer e a questão do valor de verdade,

Freud denuncia o preconceito em relação ao valor da palavra, e nos remete à diferença

entre a cura pela palavra - a palavra realizando-se como ato na transferência - e a cura na

clínica médica, que se realiza como ação sobre o real sem necessariamente desconsiderar o

campo transferencial, quando em seqüência nos fala:

Os desinformados parentes de nossos pacientes, que se impressionam apenas com

coisas visíveis e tangíveis - preferivelmente por ações tais como aquelas vistas no

cinema -, jamais deixam de expressar suas dúvidas quanto a saber se ‘algo não pode

ser feito pela doença, que não seja simplesmente falar’. Essa, naturalmente, é uma

linha de pensamento ao mesmo tempo insensata e incoerente. Essas são as mesmas

pessoas que se mostram assim tão seguras de que os pacientes estão ‘simplesmente

imaginando’ seus sintomas. As palavras, originalmente, eram mágicas e até os dias

atuais conservaram muito do seu antigo poder mágico. Por meio de palavras uma

pessoa pode tornar outra jubilosamente feliz ou levá-la ao desespero, por palavras o

professor veicula seu conhecimento aos alunos, por palavras o orador conquista

seus ouvintes para si e influencia o julgamento e as decisões deles. Palavras

suscitam afetos e são, de modo geral, o meio de mútua influência entre os homens.

Assim, não depreciaremos o uso das palavras na psicoterapia, e nos agradará ouvir

as palavras trocadas entre o analista e seu paciente (Freud, [1916 [1915]] 1976,

p.29-30).

A questão das relações entre a doença e a pessoa doente e entre esta e a ordem

social ganham destaque no século XX. Na década de 20, na Alemanha, emerge um

discurso médico antropológico, cujos representantes mais expressivos foram Weizsäcker,

Schwartz e Krehl. Esse discurso médico antropológico, usando o modelo compreensivo,

articula a enfermidade internamente com a história de vida do paciente, formulando-a

como uma “patologia biográfica”. A enfermidade passa a ser considerada não só no plano

da causa, onde ela é explicada pelo discurso biológico, mas também no plano da

significação, onde ela é compreendida como experiência na temporalidade de uma

existência. Este movimento humanista, relacionado a progressivas críticas à prática clínica

pelo seu desinteresse na pessoa do doente, teve seus suportes teóricos na filosofia alemã

kantiana e neo-kantiana.

Na década de 30, surge uma contribuição, cuja expressão e difusão associada à

denominação Medicina Psicossomática, diferentemente da Medicina Antropológica

restringe-se à postulação de uma causalidade psíquica. Em particular os trabalhos de

Alexander e French, psicanalistas do Instituto Psicanalítico de Chicago, propuseram a

presença de “conflitos básicos”, “conflitos típicos” da úlcera duodenal, colite ulcerativa,

asma brônquica, neurodermatite, hipertensão essencial, artrite reumatóide e tireotoxicose -

as sete doenças conhecidas, a partir de então, como doenças psicossomáticas. Em nenhum

momento, esses autores interrogam o estatuto social da enfermidade somática.

A postulação de doenças psicossomáticas baseada na psicogênese de certos

transtornos orgânicos aprisiona-se no modelo explicativo-causal, o que contribuiu para a

sua aceitação e difusão no meio médico. No entanto, no meio psicanalítico, essa aceitação

é mais problemática, chegando mesmo a ser entendida como um reducionismo inaceitável.

Na estrutura etiológica da enfermidade passam então a participar outras séries

causais além da causalidade linear biológica, quais sejam as causalidades de ordem

psíquica e as de ordem sociológica e antropológica em sentido estrito. Como escreve Joel

Birman:

A Medicina entra na região da interdisciplinaridade, adquirindo neste campo de

práticas o mesmo estatuto ambíguo, do ponto de vista epistemológico, que em

outros campos teóricos. Com efeito, este conjunto de discursos não se refere ao

mesmo objeto científico, mas a uma pluralidade de objetos que encontram a sua

delimitação e as suas verdades nos saberes de origem: Psicologia, Sociologia,

Antropologia, Psicanálise e Biologia. Eles não se articulam na sua intimidade

conceitual, construindo um outro objeto para o saber médico, mas se justapõem,

tendo como referente empírico os indicadores da saúde e da doença. Pluralidade

discursiva, dispersão de novos objetos, eis o contexto significativo da questão se a

encaramos da perspectiva da estrita lógica conceitual de cada um dos saberes

referidos (Birman, 1980, p.25-26) (grifos do autor).

Na década de 50, o psicanalista húngaro Michael Balint desenvolve na Clínica

Tavistock os Seminários de treinamento e pesquisa sobre problemas psicológicos na

prática da clínica geral, numa tentativa de resposta à demanda social constituída por

clínicos gerais que apontavam a insuficiência da formação médica com relação à grande

demanda de doentes funcionais. Balint, considerando que “a droga mais freqüentemente

utilizada na clínica geral era o próprio médico”, parte para uma proposta interdisciplinar de

estudo da “farmacologia da substância médico”, empreendendo uma investigaçãotreinamento

das possibilidades de aplicação da teoria psicanalítica no campo dinâmico da

relação médico-paciente. Com o objetivo de estudar e desenvolver a função psicoterápica

dos clínicos gerais em sua relação com seus pacientes - no interjogo das “ofertas” dos

pacientes e das “respostas” dos médicos - Balint centrava-se na contratransferência dos

médicos, ou seja, no “modo como o médico utiliza sua personalidade, suas convicções,

seus conhecimentos, seus padrões habituais de reação, etc.” (Balint, 1975, p.255).

A reconstrução elaborada pelo grupo, nos seminários, sobre um determinado

encontro clínico poderia ser avaliada, compreensivamente, na evolução dessa relação

clínica, em analogia ao processo psicanalítico, validando a interpretação como se faz na

seqüência das sessões psicanalíticas. Nesse sentido, não é suficiente levar em conta apenas

a evolução da doença, mas o paciente como um todo nessa relação clínica com seu médico.

Balint postula a patologia da pessoa total ou a medicina da pessoa total, o que nos leva ao

problema da interpretação na atividade psicoterápica do médico clínico, a qual

possibilitaria ao paciente “compreender-se a si mesmo”.

Balint diferencia “dois tipos de medicina”: a medicina científica ou hospitalar,

ensinada e praticada na sua forma mais pura nos hospitais universitários, e a que ele

denominou de prática médica. A medicina da pessoa total seria aplicável à prática

médica, sendo constituída por um diferente tipo de objetividade científica e, nesse sentido,

novos critérios deveriam ser desenvolvidos. A medicina científica ou hospitalar deveria

manter-se referida ao diagnóstico preciso e à terapêutica nele baseada e validada pelo

modelo do “experimento duplo cego” (Balint & Balint, 1961, p.127).

Evidentemente, os saberes emergem, se difundem e se instituem em maior ou

menor grau, na medida em que respondem a certas demandas que se ordenam no espaço

social, determinando mudanças significativas nas práticas sociais nesse cenário sempre

dinâmico.

No último pós-guerra, rompe-se um silêncio de um século com relação à medicina

social. A medicina passa por um processo de mudança de seu lugar social, retomando “um

espaço político pertinente à moderna fase do Capitalismo” (Birman, 1980, p.45). Surge,

nessa época, a Organização Mundial da Saúde, que não define a saúde negativamente, mas

a define muito além da “vida no silêncio dos órgãos” (Leriche apud Canguilhem, 1978,

p.67), numa concepção muito mais ambiciosa: A saúde é um estado de completo bemestar

físico, mental e social, e não consiste somente em uma ausência de doença ou

enfermidade (OMS).

A saúde é, mais uma vez, mas de certa forma inédita, enfatizada não como um

estado dado pela natureza, mas sim um estado também construído pelos indivíduos

socialmente. A ênfase passa a ser colocada na promoção da saúde referida ao bem-estar

social e à felicidade humana, ganhando, portanto, a dimensão preventiva da medicina

maior relevância estratégica em relação à dimensão terapêutica.

No último pós-guerra, com as novas concepções de cidadania e saúde, passando a

saúde a ser um direito de todos e um dever do Estado, a questão da promoção da saúde e

bem-estar social emerge com maior destaque. A psiquiatria incorpora o discurso

psicanalítico, por ela transformado, e desenvolve a psiquiatria comunitária. Processa-se,

então, uma reforma nas instituições psiquiátricas no sentido de transformar o ambiente

asilar em um meio terapêutico que, nesse momento histórico, privilegia a “atuação sobre as

microrredes das inter-relações pessoais, atingindo diretamente a individualidade” (Birman,

1980, p.78).

A psiquiatria trará, então, para a medicina o “dispositivo das inter-relações”, cuja

expressão mais clara se encontraria nas contribuições de Michael Balint. Com um valor de

humanização da prática médica geral, a psiquiatria, numa mudança de articulação com a

medicina, passa a instituir um discurso sobre a relação médico-paciente, a partir da década

de 50, dando mesmo a ilusão de que a medicina sempre foi, imutavelmente, uma prática

humanista. É, então, somente na década de 50, que o pensamento psicanalítico se articula

de forma original ao pensamento médico, criando práticas específicas na instituição médica

(Birman, 1980, p.31).

A análise realizada por Joel Birman (1980) tem seu valor no sentido do

questionamento do uso de um saber psicanalítico ativamente transformado na prática social

da medicina, aprimorando e justificando o controle sobre os indivíduos e suas relações

interpessoais, embora tenhamos dúvidas quando ele postula que o “saber das interrelações”

historicamente chegou a se transformar na “racionalidade hegemônica da

medicina”, deslocando a um plano secundário a racionalidade anátomo-clínica (p.140). Se

a psiquiatria, a partir da influência de uma psicanálise diluída no seu valor crítico e

subversivo, ampliou o poder médico, não só o instrumentando para uma finalidade

adaptativa dos indivíduos aos seus ambientes sociais, mas também chegando a possibilitar

um “acesso abusivo às pessoas” que nada tem a ver com o projeto freudiano, ao mesmo

tempo, como o autor reconhece, ela trouxe um questionamento ao projeto ético e

terapêutico da medicina, limitando seus excessos pragmáticos reduzidos à “maquinária

corporal” (p.73). É, sem dúvida, reconhecendo esses dois perigos na inter-relação entre

psicanálise e medicina, que se pode trabalhar criticamente. Nesse sentido, concordamos

com Birman que a relação médico-paciente assume configurações que não são só função

das biografias de seus atores, mas, também, função do “lugar social designado para o

médico, o paciente e a enfermidade” historicamente situados e não “essências transhistóricas

como se ilude até hoje a visão positivista do saber” (p.176).

Uma expressão do prestígio social da articulação dos discursos das ciências

humanas e sociais com o discurso médico pode ser depreendida do grande número de

pesquisas realizadas nos EUA, na área conhecida por “Ciências do Comportamento”, entre

1954 e 1960, sendo um quarto delas voltadas para os aspectos psicossociais das

enfermidades (Health Information Foundation, 1961 apud Birman, 1980, p.49).

Na década de 50 e 60, as escolas médicas americanas tinham psiquiatras de

orientação psicanalítica e cientistas sociais1 que pesquisavam e ensinavam o interjogo

dinâmico dos fatores psicológicos, sociais, culturais e biológicos na saúde, na doença e no

cuidado aos pacientes. São também deste período os estudos clássicos sobre o processo de

socialização através do qual estudantes de medicina se transformam em médicos2, assim

como estudos críticos sobre o hospital como organização social e sua repercussão nas

relações entre profissionais de saúde, pacientes e familiares, com ênfase no poder médico e

a conseqüente desumanização, assujeitamento ou objetificação do doente implicada em seu

exercício3.

Nos EUA, com o surgimento nos anos 70 do campo interdisciplinar conhecido por

bioética e com o desenvolvimento da psiquiatria de orientação predominantemente

biológica, na maioria das escolas médicas, progressivamente, a bioética vem ocupando o

lugar da psiquiatria e das ciências sociais na transmissão de conteúdos “não-biomédicos”

aos estudantes de medicina (Fox, 1999, p.8).4

Destacamos a recente análise de Renée Fox (1999) que nos afirma que, desde a

reforma flexneriana em 1910, o ensino dos aspectos “não-biomédicos” nas escolas médicas

americanas tem sido persistentemente problemático e freqüentemente não bem sucedido

(p.4). Como disciplina isolada, geralmente de curta duração, oferecidas durante o ciclo

básico (primeiro ou segundo ano pré-clínicos), as ciências do comportamento e também

mais recentemente a bioética ou as humanidades médicas não conseguem integrar-se ao

ensino da clínica.

Na Faculdade de Medicina da UFRJ, a disciplina de Psicologia Médica dedicada ao

ensino da relação médico-paciente foi introduzida pelo Prof. Danilo Perestrello, psiquiatra

e psicanalista, ainda nos anos 50. No entanto, como esses saberes se articulam numa

prática particularizada? Desde 1980, como professora da disciplina de Psicologia Médica

do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal e em atividades docente-assistenciais no

Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, nunca tivemos a oportunidade de nos

deparar com uma “História da Pessoa”5 - item da anamnese instituído na folha padrão do

prontuário médico - preenchida, exceto nos seus aspectos referidos aos chamados “hábitos

(fumo, álcool, tóxicos, anticoncepcionais)”, padrões de “alimentação” e características de

“moradia”. A título de ironia comentaríamos, ainda, que por vezes o espaço se encontra

totalmente em branco e, uma vez, foi assim preenchido: “nada de relevante”. Sob a

epígrafe “História da Pessoa” encontramos o silêncio ou a rara explicitação registrada:

“nada de relevante”.

 

Literatura e Medicina

Em 1994, cerca de um terço das escolas médicas dos Estados Unidos tinham em

seus currículos cursos de literatura e medicina, a maioria sendo oferecida nos anos préclínicos,

como parte do currículo obrigatório ou como módulo eletivo, em geral,

integrando o ensino de medical humanities (humanidades médicas) que contempla estudos

em filosofia, história, direito, religião, etc. (Charon e cols., 1995). Em 1998, o ensino de

literatura e medicina já havia se expandido para 74% (93/125) das escolas médicas

americanas (Association of American Medical College’s Curriculum Directory 1998/1999

apud Charon, 2000) indicando claramente sua importância institucional no ensino médico.

Com o estudo da literatura pretende-se desenvolver a “competência narrativa”,

aumentar a tolerância à incerteza da prática clínica e propiciar a atenção empática a

pacientes. Por competência narrativa os autores enfatizam a capacidade de adotar outras

perspectivas, de seguir o encadeamento de histórias complexas, por vezes caóticas, tolerar

ambigüidade e reconhecer os múltiplos, freqüentemente contraditórios, significados dos

acontecimentos vivenciados pelas pessoas. Participam do ensino doutores em literatura e

doutores em medicina, fortemente interessados na contribuição da literatura à prática

clínica, sendo esse trabalho conjunto, na opinião dos autores, a estratégia ideal para todas

as iniciativas no ensino das humanidades no curso médico (Hunter e cols., 1995).

Os autores consideram como um dos elementos mais importantes, ausente nos

cursos de graduação de literatura assim como nas outras disciplinas do curso médico, a

exploração explícita das associações e respostas emocionais dos leitores suscitadas pela

leitura de textos literários. A partir do texto, propicia-se que os estudantes discutam

percepções, crenças e valores.6

Freud, na sua conferência para a associação médica de Viena, em 1904, defendendo

a causa da psicoterapia, “a mais antiga forma de terapêutica em medicina”, menciona os

efeitos da sugestão determinados pela “transferência” na relação médico-paciente e

valoriza a “palavra de conforto” que os médicos podem trazer aos doentes.

A função psicoterápica na relação médico-paciente ou o poder terapêutico das

palavras reconhecido por Freud que, apenas na década de 50, com o trabalho pioneiro de

Balint ganhou maior difusão entre os médicos, retorna atualmente na literatura médica

internacional com a valorização da narrativa na prática médica. Vários trabalhos apontam

neste sentido através da produção de textos na relação médico-paciente, ora textos escritos

por médicos sobre seus pacientes, posteriormente a eles apresentados (Charon, 2001), ora

textos produzidos por pacientes a partir da demanda de seus médicos (Charon et al,1996).

Rita Charon nos fala sobre este ato na sua experiência com seus pacientes:

Se o meu ato de escrever constituiu um passo na geração de hipóteses na forma de

uma pesquisa intersubjetiva, apenas o paciente poderia testar a hipótese. [...] Foi

como se o meu ato de escrever sobre e para meus pacientes desencadeasse um

processo de desvelamento que talvez ocorresse mais tarde, se é que ocorreria, na

relação. E, mais importante, este desvelamento foi terapêutico (Charon,2001, p.85).

É com familiaridade mas também com certa estranheza que lemos esta produção de

médicos e professores de literatura. A estranheza é por conta da ausência de referência

nestes textos da contribuição institucionalizada de psicanalistas e cientistas sociais à

formação e prática médicas e, também, o entusiamo romântico que transparece na

descoberta destes autores do poder terapêutico das palavras, da dimensão e eficácia

simbólicas presentes nos atos médicos. Esta estranheza é que talvez nos fez alongar a breve

história com a qual tentamos contextualizar este movimento atual, certamente enriquecedor

para a prática e a educação médicas, mas não sem importantes tensões.

Os autores, em geral, enfatizam fatores que contribuem atualmente para uma

prática médica impessoal, entre eles, a especialização e a tecnologização da medicina, o

mercado de trabalho e a revolução da informática, para sugerirem contextualmente a

emergência da narrativa na prática médica com um valor de humanização.

Entre nós, em 1987, Zaidhaft (1990) e Spitz introduziram o uso de textos literários

na avaliação dos alunos na disciplina de Psicologia Médica. Selecionaram textos das obras

A morte de Ivan Ilitch de Leon Tolstoi e Uma morte muito suave de Simone de Beauvoir,

que nos falam da experiência do adoecimento, da proximidade ou da antecipação da morte

e das relações vividas entre enfermo, familiares e médicos. Analisando a experiência

pedagógica, os professores sublinham a originalidade, a criatividade nas respostas dos

alunos, que não teriam se limitado a escrever “simplesmente o que imaginaram que o

professor gostaria de ler” (p.149).

Tendo em mente seu auditório, Zaidhaft (1990) explicita “as questões inevitáveis: o

que tudo isso tem a ver com Medicina? Filmes, romances, respostas originais?” (p.149).

Para o autor, a possibilidade de narrativas sobre como os médicos são vistos por pacientes

e seus familiares, como as decisões médicas repercutem e “podem determinar o rumo” da

vida e da morte de uma pessoa teriam o objetivo de contribuir para a reflexão crítica dos

alunos sobre sua prática e de preservar a sensibilidade, a capacidade de perceber a si

próprios e a seus pacientes como seres humanos (Cf. Zaidhaft, 1990, 143-149).

Foucault faz uma observação interessante sobre o discurso científico e literário a

partir do século XVII e a função do autor: no primeiro, ela se enfraqueceu e, no segundo,

ela se reforçou. Ora, médicos iludidos como homens de uma prática científica não podem

pretender “a função de autor”, mas apenas se tornarem conhecedores competentes de um

“sistema anônimo” - a medicina enquanto disciplina. No entanto, sua aplicação ao caso

singular, no cotidiano de uma prática personalizada, mesmo que institucionalizada,

convoca o “sujeito como função da intersubjetividade” (Vital Brazil, 1998) e implica o

conflito das escolhas responsáveis sobretudo para os médicos que, por sua vez, lidam

também, com dificuldade, com as possíveis escolhas responsáveis dos pacientes.

Nesse sentido é importante a busca do trabalho interdisciplinar de médicos e

professores de literatura na formação médica, a partir da década de 70, no sentido de

sensibilizar os estudantes de medicina à dimensão narrativa, problematizando “a função de

autor” na prática médica. Esta função torna-se mais evidente quando consideramos o

julgamento clínico indissociável de uma ética.

 

Ética Narrativa

A ética narrativa vem ganhando maior relevância à medida que cresce a

insatisfação com a ética baseada em princípios – autonomia, beneficência/não-maleficência

e justiça – que, de modo analítico, aplica estes princípios universais a casos particulares

visando a solução de dilemas éticos.

Numa primeira fase, sobretudo até os anos 90, a presença da literatura nas escolas

médicas americanas era freqüentemente justificada por sua contribuição ao ensino da ética

médica. Textos literários, em especial escritos por médicos escritores, eram apresentados

como exemplos de caso para a aplicação dos princípios éticos gerais visando determinar

logicamente a melhor solução ética para os dilemas do caso.7 No entanto, a riqueza dos

trabalhos literários propiciou o aprendizado de algo a mais do que a autonomia do

paciente, o paternalismo médico, etc... Os alunos começaram a perceber “como princípios

éticos e argumentos podem, algumas vezes, ser usados para racionalizar um

comportamento anti-ético” (Jones, 1999, p.254).

Nos últimos anos, o trabalho de professores de literatura na medicina tem sido

marcado por seu interesse na “centralidade da narrativa no trabalho médico” (Jones, 1997).

Atualmente, distingue-se abordagens narrativas ou contribuições da narrativa à ética

médica, que se utiliza das técnicas de análise literária para enriquecer a prática de ética

médica baseada em princípios, e a ética narrativa, que busca substituir o principalismo

por uma prática paradigmaticamente diferente (Jones, 1999, p.255).

No campo das contribuições da narrativa à ética médica, Rita Charon se destaca,

defendendo a aplicação de métodos da crítica literária e teoria da narrativa à prática médica

para propiciar que os médicos se tornem narrativamente competentes podendo, inclusive,

prevenir crises na relação médico-paciente envolvendo dilemas éticos. As mesmas

questões que os alunos aprendem a formular ao ler um texto literário podem ser aplicadas

na análise de textos ou práticas éticas.

Já a ética narrativa, partindo do caso particular, considera os princípios da ética

médica analítica como valores ideais inerentes ao contexto cultural do caso e não como

princípios absolutos a serem aplicados. Referindo-se ao trabalho de Kathryn Hunter (1991)

- para quem o julgamento clínico e as considerações éticas são indissociáveis e,

essencialmente, narrativos - Jones nos fala que a ética narrativa, ao partir do caso

particular, opera de modo análogo ao raciocínio clínico, que não é nem indutivo nem

dedutivo, mas sim abdutivo, ou seja, um procedimento hermenêutico, circular que busca a

aplicação de leis ou princípios ao caso particular (Jones 1999, p.256). Como nos diz

Hunter:

Embora princípios sejam essenciais para a bioética e a ciência biológica precisa

sempre informar a boa prática clínica, a tendência a colapsar a moralidade em

princípios e a medicina na ciência empobrece ambas as práticas. Em ambos os

casos, tal redução toma a ciência como modelo para algo que não pode ser

puramente científico. É uma tentativa de conhecer de modo genérico e abstrato o

que não pode ser conhecido a não ser através do caso particular – e para ser melhor

conhecido este caso precisa ser ricamente conhecido (Hunter, 1996, p.316).

A ética narrativa, considerando de forma não-hierárquica e dialógica as diversas

perspectivas, valores, emoções dos sujeitos implicados no caso sempre contextualmente

situado, é vista como controversa e, mais de uma vez, foi referida como “perigosa” por

autores conhecidos do campo da bioética (Jones, 1996, p.268)8. No entanto, não podemos

deixar de sublinhar que ela é muito mais próxima da psicanálise. Mais uma vez dando a

palavra a sua principal defensora:

Na sua forma ideal, a ética narrativa reconhece a primazia da estória do paciente,

mas encoraja que sejam ouvidas as múltiplas vozes com suas múltiplas estórias de

todas as pessoas cuja vida estará de algum modo implicada pela resolução do caso.

Paciente, médico, família, enfermagem, amigos, assistente social, por exemplo,

podem compartilhar suas estórias num coro dialógico que pode oferecer a melhor

chance de respeitar todas as pessoas envolvidas no caso (Jones, 1999, p.256).

 

Medicina Baseada na Narrativa

A partir de um caso clínico Dra. Greenhalgh (1998) aborda a questão da narrativa

de uma forma original ao usar o “paradigma narrativo interpretativo”. Ela nos relata a

seguinte vinheta clínica:

Dr. Jenkins recebeu um telefonema de uma mãe que disse que sua filha pequena

tinha tido uma diarréia e estava se comportando de modo estranho. Dr. Jenkins

conhecia bem a família e ficou tão preocupado que decidiu interromper seu

consultório, em plena manhã de 2ª feira, para visitar a paciente imediatamente

(p.253).

A partir desta ação, Dr. Jenkins confirmou sua hipótese diagnóstica de meningite

meningocóccica tendo esta decisão conseqüências definitivas para sua jovem paciente.

Greenhalgh destaca que a hipótese diagnóstica foi baseada em dois sintomas muito

inespecíficos (diarréia e comportamento estranho) e, ainda, por um clínico geral que havia

feito apenas uma vez este diagnóstico em 96.000 consultas.

Greenhalgh apresenta sua “interpretação” sobre o processo decisório ou o possível

desenvolvimento do julgamento clínico realizado por Dr. Jenkins. A autora supõe que Dr.

Jenkins tenha integrado criteriosamente evidências bem selecionadas (por exemplo, a

diferença no prognóstico em função da administração urgente ou não de penicilina quando

do diagnóstico precoce de meningite menincogóccica) com o significado potencial da

expressão “de modo estranho” utilizada pela mãe da paciente ao qualificar o

comportamento da filha (esta não é inclusive uma expressão freqüentemente utilizada por

pais ao descrever manifestações de doenças inespecíficas em seus filhos) e, ainda, com seu

conhecimento da família, que o informava não se tratar de pessoas de estilo queixoso assim

como o comportamento da criança, até então, nada tinha de extraordinário.

Com este exemplo, Greenhalgh argumenta sua principal tese, qual seja, de que a

medicina baseada na narrativa deve complementar a medicina baseada em evidência pois,

no caso particular, as evidências são sempre parte de um história construída, portanto, uma

interpretação, a partir de diversos elementos, inclusive elementos contextuais. Como nos

diz a autora, se o Dr. Jenkins tivesse abandonado seu julgamento clínico em prol de uma

simples adesão ao protocolo de diagnóstico precoce e tratamento de meningite, ou seja,

tivesse abandonado o trabalho interpretativo em favor da orientação sugerida pela

evidência descontextualizada, possivelmente a paciente não teria sido salva e o trabalho

médico teria resultado frustrante, como freqüentemente tem sido registrado em estudos

sobre a aplicação pelos profissionais dos resultados da pesquisa baseada em evidências.

Enfatiza Greenhalgh (1998): “as ‘verdades’ estabelecidas pela observação empírica de

populações em ensaios controlados randomizados e estudos de cohorte não podem ser

mecanicamente aplicados a pacientes individuais cujo comportamento é irremediavelmente

contextual e idiossincrático” (p.251).

Como analisa Madel Luz (1988), o surgimento de uma racionalidade anátomoclínica,

inscrita na racionalidade científica moderna mecanicista e organicista, levou a uma

transformação progressiva da medicina no sentido de um “deslocamento epistemológico”

de uma arte de curar indivíduos para uma disciplina das doenças, passando a configurar

para o médico, na sua prática clínica, uma tensão conflitiva entre o “artesão da cura” e o

“cientista da doença”. O cientista da doença está referido a um paradigma analítico que

busca o universal através da objetivação da doença. O artesão da cura está referido a um

paradigma indiciário, que postula a exigência da interpretação dos dados e a relevância dos

fatos singulares na clínica, em referência a um conhecimento construído pela acumulação

de experiências singulares e particulares ao diagnosticar e tratar inúmeros pacientes.

Esse paradigma indiciário é uma postulação de Ginzburg ao pretender contribuir

para a discussão da produção do conhecimento em ciências humanas, tentando “sair dos

incômodos da contraposição entre racionalismo e irracionalismo” (Ginzburg, 1989, p.143).

Para esse autor, tal paradigma passou a ter expressão a partir do final do século XIX e ele

nos mostra, inclusive, como Freud foi reconhecidamente influenciado por ele, como nos

ilustra uma passagem em O Moisés de Michelangelo (1914). E o próprio Ginzburg nos fala

da importância desse paradigma na medicina:

Ora, é claro que o grupo de disciplinas que chamamos de indiciárias (incluída a

medicina) não entra absolutamente nos critérios de cientificidade deduzíveis do

paradigma galileano. Trata-se, de fato, de disciplinas eminentemente qualitativas,

que têm por objeto casos, situações e documentos individuais, enquanto

individuais, e justamente por isso alcançam resultados que têm uma margem

ineliminável de casualidade; basta pensar no peso das conjeturas (o próprio termo é

de origem divinatória) na medicina (Ginzburg, 1989, p.156) (grifos do autor).

A racionalidade anátomo-clínica, que organiza as diferenças dos “casos”

individuais na construção da doença enquanto modelo descritivo e explicativo, quando

articula o olhar à linguagem - “o olhar loquaz” que investiga e descobre - não pode excluir

a questão da interpretação dos sintomas e sua transformação ou não em signos de doença

no raciocínio diagnóstico realizado pelo médico na sua prática clínica. No entanto, como

nos aponta Foucault:

O médico, pouco a pouco, deixou de ser o lugar de registro e de interpretação da

informação, e porque, ao lado dele, fora dele, constituíram-se massas

documentárias, instrumentos de correlação e técnicas de análise que ele tem,

certamente, que utilizar, mas que modificam, em relação ao doente, sua posição de

sujeito observante (Foucault, 1995a, p.38).

O estarmos "talvez” no “limiar de uma nova medicina” aparece incidentemente

nesse contexto da argumentação de Foucault9, o que nos faz pensar na desvalorização da

prática clínica como produção de conhecimento sobre as doenças no contexto significativo

da relação médico-paciente.

Não muito tempo após a morte de Foucault, surge a medicina baseada em

evidência, um discurso sobre a clínica que pretende fazer “uma ciência da arte médica” ao

estabelecer uma racionalidade a partir da articulação dos conhecimentos clínico e

epidemiológico sobre as doenças.

Seus principais autores preocupam-se com o fenômeno por eles denominado

“discrepância clínica”, ou seja a inconsistência entre observações quer de dois ou mais

médicos (inconsistência interobservador) quer de observações repetidas pelo mesmo

médico (inconsistência intraobservador) que, em alguns estudos chega a 50%, seja a cerca

de elementos da história clínica, do exame físico, da interpretação de provas diagnósticas,

seja do diagnóstico formulado ou da escolha da conduta terapêutica (Sackett et al, 1994,

pp.38-48).

Na definição de seus principais autores:

A medicina baseada em evidências consiste no uso judicioso, explícito e

consciencioso da melhor evidência disponível para a tomada de decisões que se

referem ao cuidado de pacientes individuais. A prática da medicina baseada em

evidências significa integrar perícia clínica individual com a melhor evidência

clínica externa disponível, obtida a partir de pesquisa sistemática. Por perícia

clínica individual entendemos a proficiência e julgamento que cada clínico

individualmente adquire através de sua experiência e prática clínicas. [...] Por

melhor evidência clínica externa disponível nos referimos à pesquisa clinicamente

relevante proveniente freqüentemente das ciências básicas da medicina, mas,

especialmente, à pesquisa clínica centrada no paciente, acerca da precisão e

exatidão dos testes diagnósticos (incluindo o exame clínico), do poder preditivo de

marcadores prognósticos e da eficácia e segurança de regimes terapêuticos,

preventivos e de reabilitação (Sackett et al, 1996, p.71).

O crescimento exponencial do conhecimento na área médica, sua conseqüente

especialização e, ainda, o desenvolvimento acelerado da tecnologia, aumentam as

exigências para o médico na realização de suas escolhas e decisões em sua prática clínica.

A medicina baseada em evidência, pretendendo uma racionalização das decisões médicas,

é uma tentativa de resposta que, objetivando uma prática mais útil, eficiente, menos cara e

pretensamente mais científica, vem tendo uma penetração privilegiada, mas não sem

controvérsias.

Concordamos com Serpa (1999) quando ele nos fala que “a semiologia médica

consiste no conjunto de técnicas de produção de evidências” e que devemos compreender o

conhecimento produzido por ensaios controlados randomizados, a metanálise, enfim, a

produção da medicina baseada em evidência como “algumas, entre muitas, possibilidades

de narrativa. Boas, enquanto servirem a determinados fins, mas não as melhores para todo

e qualquer fim” (p.73-74).

 

A Voz dos Pacientes e a Escuta dos Médicos

O problema é dar voz aos pacientes na sua experiência de doença e tratamento, nas

suas expectativas, anseios, preferências, o que nos remete ao contexto desta comunicação,

num primeiro plano, ao modelo de relação médico-paciente.

Em nossa experiência num hospital público universitário na cidade do Rio de

Janeiro, o modelo hegemônico é o modelo paternalista que, em essência, pressupõe que o

médico detém todo o conhecimento necessário para definir o problema e as melhores

soluções em termos de tratamento, de tal forma que suas decisões e ações necessariamente

se darão no melhor interesse do paciente sem que este expresse suas expectativas,

preferências, enfim valores, veiculados a sua experiência de sofrimento.

O fato de apresentarmos em sala de aula, na disciplina obrigatória de Psicologia

Médica, os diferentes modelos de relação médico-paciente – paternalista, informativo, de

decisão compartilhada – e discutirmos suas implicações, ainda que apoiados no argumento

de autoridade, geralmente tão eficaz, representado por artigos recentes de periódicos

médicos internacionais de reconhecido prestígio e, também, pelo documento Os Direitos

do Paciente tornado lei estadual em São Paulo, evidentemente, nosso esforço não supera o

efeito pedagógico maior que é a identificação que os alunos realizam com médicos e

professores no exercício da prática médica.

Apenas no modelo de decisão compartilhada os médicos estão comprometidos com

uma relação com seus pacientes, cujo desenvolvimento evidentemente é muito mais

complexo do que o modelo paternalista ou o informativo, que são as alternativas mais

difundidas entre estudantes e médicos, o primeiro por sua tradição, não só em nossa

cultura, e o segundo pela marcante influência da cultura médica americana entre nós.

Não podemos deixar de destacar um belo exemplo, recentemente publicado pelo

British Medical Journal,10 de um clínico geral e sua paciente assintomática de

hemocromatose diagnosticada através de teste genético. Os dois vivem a posteriori a

dúvida de se ter realizado o tratamento teria sido, de fato, a melhor opção. O comentário de

um outro clínico geral e de um hematologista enriquecem a discussão.

Sem dúvida, o reconhecimento do limite e da incerteza do conhecimento médico no

exercício da prática médica se articula à valorização da escuta do paciente, ao valor de suas

palavras, de sua experiência. Isto nos lembra Foucault quando ele nos fala da crítica à

profissão médica que, a seu ver, não é “essencialmente por ser um empreendimento

lucrativo, porém, porque exerce, um poder sem controle sobre os corpos das pessoas, sua

saúde, sua vida e morte” (Foucault, 1995b, p. 234). Para esse autor, um dos aspectos

críticos da medicina atual é o risco associado, não à ignorância, mas ao desenvolvimento

do conhecimento, das tecnologias e do poder político.11

O verdadeiro problema é o que eu chamaria, não de iatrogenia, mas de iatrogenia

positiva: os efeitos medicamente nocivos que se devem, não a erros de diagnóstico

ou à ingestão casual de medicamentos, mas à própria ação da intervenção médica

no que ela tem de racionalmente fundada. [...] Não é mais o não-saber que é

perigoso, mas o próprio saber. E o saber é perigoso não somente por suas

conseqüências imediatas ao nível do indivíduo ou de grupos de indivíduos mas ao

nível da própria história. Esta é uma das características fundamentais da crise atual

(Foucault, 1974, 1ª Conferência).

 

A Voz de Estudantes de Medicina e a Escuta de Professores: uma Proposta

Instituída

Podemos iniciar a discussão sobre o valor da troca de palavras entre alunos e

professores com este fragmento de um texto entregue ao professor de Psicologia Médica,

por uma aluna do 6º período do curso médico sobre sua experiência ao tratar de um

paciente terminal:

... E vou dizer também que ando um pouco triste e, em parte, é devido à falta de

ficção na minha medicina, construída ultimamente apenas com livros técnicos; e

que esta falta me é tão grave quanto a falta de sódio ou potássio num organismo, e

que, além de querer para mim, quero aumentar a carga circulante dessa delicadeza

em algumas pessoas, as que sei possuírem receptores centrais e periféricos para

estas partículas inofensivas.

A discussão de casos clínicos coloca uma questão, a nosso ver, central na formação

da identidade médica. Concordamos com Byron Good12 quando ele diz que as atividades

de apresentação oral e escrita sobre pacientes realizadas pelos alunos são “práticas

formativas”, que não descrevem meramente a realidade, mas constituem formas de

construí-la: a construção do paciente como caso clínico, como um projeto médico -

informações apreciadas como relevantes para a elaboração do diagnóstico e das decisões

terapêuticas (Cf. Good, 1994, p.76-83).

Na Faculdade de Medicina da UFRJ, os alunos do 4º período iniciam a

apresentação oral e escrita de casos clínicos realizando anamneses e exames físicos que são

apresentados, rotineiramente, aos professores de Clínica Médica para serem avaliados. Nos

6º e 7º períodos, os alunos passam a escrever nos prontuários suas anamneses, exames

físicos mas, sobretudo, as evoluções clínicas diárias. Começam, também, a participar dos

rounds da enfermaria e, mais eventualmente, de sessões clínicas dos postos ou serviços,

onde os internos e residentes são os principais relatores de casos clínicos.

Desnecessário dizer que nas apresentações habituais de casos clínicos, a pessoa do

paciente é essencialmente um lugar “geográfico” que sedia a doença e não um lugar

enunciativo ou de um agente narrativo. As apresentações orais e escritas são, portanto,

fundamentais, tanto na construção da identidade médica do aluno, quanto na construção da

“identidade” do paciente como caso médico ou como objeto do olhar e do discurso

médicos. A medicina constrói, assim, os seus objetos como objetos de conhecimento na

formação dos médicos, que informam a direção de um olhar que pressupõe o que deve ser

visto. Estas apresentações narrativas geram efeitos importantes: estruturam o diálogo com

o paciente em todo o processo clínico, da anamnese à alta, e estruturam, também, o diálogo

entre os alunos e outros estudantes ou profissionais da equipe de saúde. E, evidentemente,

esse diálogo, na hierarquia de uma instituição médica de ensino, determina que os alunos,

ao serem alvo de um controle disciplinar, aprendam falas, gestos prescritos e proscritos.

Valorizando a demanda de alguns alunos, geralmente associada à experiência nova

de assunção de pacientes, e valorizando também o nosso interesse de investigar as

vicissitudes no diálogo sistemático com um professor de Clínica Médica e alunos durante o

ciclo clínico e, ainda, aproveitando a oportunidade institucional que a reforma curricular

introduziu, propusemos uma disciplina eletiva - Reflexão sobre a Prática Médica.

Esta disciplina consiste num grupo de discussão, que se aproxima da forma de

seminário, instituído como “atividade prática”, sem pretensão de fornecer conteúdos

teóricos pré-estabelecidos, coordenado por nós com a colaboração de um professor do

Departamento de Clínica Médica, e centra-se na experiência clínica dos alunos, nas

situações por eles vividas na relação com o paciente, sua família e a equipe de saúde.

Assim, no âmbito de nossa disciplina Reflexão sobre a Prática Médica, a

apresentação de um caso clínico se coloca dialogicamente em relação aos outros modos de

apresentação de casos em contextos mais habituais durante a formação médica. É um

sistema dialógico complexo porque o aluno, ao apresentar o caso, tem como interlocutores

o professor de Psicologia Médica, o professor de Clínica Médica e os outros alunos; mas

para além dos interlocutores sempre presentes há os auditores presumidos que, como

destinatários, são presenças imanentes e que, portanto, se fazem presentes nos três

discursos que diferenciamos nesse grupo. Há ainda os personagens do “mundo médico” -

os pacientes, os familiares, os interlocutores do round, os outros profissionais da equipe de

saúde - freqüentemente citados nas falas, e os personagens do mundo pessoal do aluno.

Oferecida desde 1992, observamos que a demanda à disciplina Reflexão sobre a

Prática Médica se restringe sobretudo a alunos do 6º e 7º períodos, apesar de nela poderem

se inscrever alunos de quaisquer períodos a partir do 6º período. Pensamos que essa

demanda de estudantes de 6º e 7º períodos se associa à sua experiência de desamparo pelo

confronto com o sofrimento e a morte de seus primeiros pacientes associada a um saber

reconhecidamente mais limitado que possuem. Esse momento da formação médica é

reconhecido por vários autores como uma fase de maior intensidade conflitiva. Eles se

encontram praticamente no início do ciclo profissional e constituem o grau inferior na

hierarquia da equipe médica de uma enfermaria clínica e, portanto, ainda muito vulneráveis

às incertezas e às situações angustiantes da prática clínica.13

O desafio para os profissionais de Psicologia Médica no ensino e no exercício da

clínica sempre foi o diálogo, a produção de um intertexto, no contexto dialógico que vai

além de uma relação entre os interlocutores. A simples adesão a uma proposta que implica

reuniões semanais durante todo um semestre, sem temas pré-fixados, nas quais se pretende,

com a bússola dos conhecimentos médico e psicanalítico, lidar com o desafio de discutir

problemas que alunos experimentam no inesperado de sua aventura clínica, exige uma

certa destituição narcísica, que possibilita a participação produtiva nestes grupos de

discussão.

A proposta encerra, de alguma forma, a possibilidade de cada participante ser

reconhecido na sua singularidade nessa experiência compartilhada. Isso nos parece

importante se compreendemos que a possibilidade de se reconhecer a singularidade do

paciente e de sua relação com o estudante ou médico é o cerne do discurso da Psicologia

Médica. Pretender que futuros médicos reconheçam a dimensão do sujeito, em cada

paciente e em si mesmos, como organizadora do encontro clínico, sem que isso se passe na

relação professor-aluno durante a formação médica seria mesmo um paradoxo.

Nesse sentido, estamos falando, a partir da psicanálise, de uma experiência que se

passa no campo da formação médica, da transmissão de um saber irredutível ao

aprendizado de uma técnica. Estamos no campo da educação realizando uma experiência

pedagógica que tem conseqüências no nível simbólico das significações produzidas entre

os sujeitos da enunciação, que ficam confrontados com os limites de um saber da técnica e

são solicitados para uma prática interpretativa em um campo de significações e valores. Ao

valorizarmos que o médico não é mais o mestre de sua medicina mas sim um agente do

discurso médico, podemos investigar a possibilidade de uma prática pedagógica, a partir da

experiência conflitiva dos alunos envolvendo, inclusive, seus ideais em relação ao

exercício profissional, se pondo além da mera formação de técnicos presidida pelo valor de

eficácia.

Nossa proposta instituída na escola médica assim como o trabalho dos autores

citados na interface literatura e medicina são uma defesa do valor de verdade no discurso e

se opõe a um dos aspectos críticos da pós-modernidade, qual seja o triunfo de uma

tecnologia que tende a reduzir a prática médica a uma aplicação de técnicas no corpo do

paciente como mero portador da doença.

 

Notas:

1 Nesta época, os cientistas sociais que conquistavam um lugar na escola médica, em geral,

se afiliavam aos departamentos de Psiquiatria.

2 MERTON, Robert K. et al. (ed) The student-physician: introductory studies in the

sociology of medical education. Massachusetts, Harvard University Press, 1957 e

BECKER, Howard S. et al. Boys in white: student culture in medical school. 4.ed. London,

Transaction Publishers, 1992, com primeira publicação em 1961.

3 STRAUSS, Anselm. The Hospital and Its Negotiated Order. In: FREIDSON, Eliot (ed.),

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Janeiro, Ed. Graal, 1979. p. 99-111. ILLICH, Ivan. A expropriação da saúde. Nêmesis da

medicina. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 1975.

4 Sobre o ensino da bioética, Renée Fox (1999) neste artigo realiza uma crítica ao ensino

hegemônico de uma bioética principalista “altamente racional, formal, amplamente

dedutiva no seu modo de argumentação, apoiada num conjunto relativamente pequeno de

conceitos - principalmente, os princípios de autonomia, beneficência, não-maleficência e

justiça, e regras derivadas relativas à verdade, privacidade, confidencialidade e fidelidade”

(p. 8-9). Apesar de nos anos 90 terem surgido fortes críticas e propostas alternativas, dentre

elas a ética narrativa sobre a qual nos referiremos mais a frente neste artigo, a bioética

americana e seu ensino nas escolas médicas ainda é dominado pelo “principalismo”

abstrato da filosofia analítica (Cf. pp.8-12).

5 Em meados da década de 70, os professores Danilo Perestrello e Abram Eksterman

propuseram a “inclusão de observações psicológicas” sob a epígrafe “História da Pessoa”,

quando da reformulação do prontuário médico para um novo modelo orientado por

problemas, no Serviço do Prof. Clementino Fraga Filho. O roteiro comentado da “História

da Pessoa” encontra-se no Apêndice do livro A Medicina da Pessoa de Danilo Perestrello,

1974, cujo texto é apresentado aos alunos do curso médico da UFRJ.

 6 Greenhalgh e Hurwitz (1998) recomendam vários textos literários considerando,

inclusive, as sugestões de diversos professores de literatura e medicina. Indicam, também,

uma base de dados em Literatura e Medicina mantida pela New York University School of

Medicine, cujo endereço fornecem: http://endeavor.med.nyu.edu/lit-med (Cf. pp.273-278).

 7 Neste sentido, The use of force de William Carlos Williams e Mercy de Richard Selzer

tornaram-se clássicos das aulas de literatura e medicina nas escolas médicas americanas.

 8 Anne Hudson Jones (1996) neste artigo nos dá um belíssimo exemplo da ética narrativa

através de sua análise do caso do pequeno Darren da novela Other Women’s Children de

Perri Klass.

 9 Por duas vezes surpreendemos a referência pouco explícita desse autor de estarmos

“talvez” no limiar de “uma nova experiência da doença” ou de “uma nova medicina”. Cf.

Foucault, 1977a, p.XIV e 1995a, p.38, respectivamente.

 10 Ver SEAMARK, Clare J. & HUTCHINSON, Margaret. Treatment can be onerous for

patient and doctor. British Medical Journal 320:1314-1317, 2000.

11 Sobre a postulação de Foucault acerca do biopoder ou a biohistória, que enfatiza o papel

regulador exercido pela medicina sobre a população, a espécie e sua articulação com a

racionalidade política, ver Foucault (1985) cap. V e (1997) p.213-235.

 12 Byron Good é antropólogo e conduziu extensa pesquisa sobre a formação médica na

Harvard Medical School, cujas conclusões a que tivemos acesso se encontram publicadas

em GOOD, Byron (1994, p.65-87) e GOOD, Byron e GOOD, Mary-Jo (1993, p.81-107).

 13 Durante o 2º semestre de 1995 gravamos, com o consentimento dos participantes, as

discussões realizadas no âmbito desta disciplina e procedemos a análise do discurso. Ver

SOUZA (1998).

 

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